A gravata colorida de Solano.


Um belo exemplo associativo de ideias foi apresentado no texto de Antonio Cícero: "Os perigos da espontaneidade", publicado na Folha de São Paulo, maio de 2009, considerando que muito do que nos vem espontaneamente não passa de ecos. Resumo aqui, em concordância:
Drumond poetizou "Que Neruda me dê sua gravata chamejante. Me perco em Apollinaire. Adeus, Maiakóvski" (poema "Consideração do Poema", do livro: "A Rosa do Povo", 1943-1945). Drummond requisita a Neruda sua gravata, item formal do vestuário masculino, ícone de socialmente aceitável. Usar o adjetivo "chamejante" muda tudo. Uma gravata chamejante é o oposto de uma convenção: lembra a gravata amarela, usada provocativamente pelo poeta revolucionário Maiakóvski.

Sim, boa surpresa, encontrada em pesquisa posterior de subsídios à minha associação, as gravatas de Maiakóvski e Solano Trindade. A de Maiakóvski é amarela. A de Solano é colorida.

Mais um eco?

Que seja... visto que o chamado "poeta do povo" foi contemporâneo do poeta mineiro.

Adoraria saber - e continuar as especulações que a boa arte instiga - quando exatamente foi escrito o belo poema de Solano,"Gravata colorida". Teria sido escrito antes ou depois do poema de Drumond? Musicado por Beto Bianchi, faz parte do novo álbum do trio r e v i s t a do samba: "s a m b a do revista", que está saindo do forno. Alguém se habilita?

Gravata colorida
Solano Trindade

Quando eu tiver bastante pão
para meus filhos
para minha amada
pros meus amigos
e pros meus vizinhos
quando eu tiver
livros para ler
então eu comprarei
uma gravata colorida
larga
bonita
e darei um laço perfeito
e ficarei mostrando
a minha gravata colorida
a todos os que gostam
de gente engravatada…

(escrito por marcia david | colaboradora do r e v i s t a  do samba)